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Maria Bethânia gravou "É o Amor" em 1999 e rebateu o termo "sucesso popularesco"

Maria Bethânia em maio de 2017 (reprodução/Instagram) 
A música "É o amor" (Zezé Di Camargo) foi gravada por Maria Bethânia e embalou a última da novela "A Força do Querer", nesta quarta-feira (26), marcando uma cena dramática entre Claudio (Gabriel Staulfer) e Ivana (carolina Duarte). A música é faixa do CD "A Força Que Nunca Seca", de 1999, lançado discretamente sem o alvoroço dos álbuns anteriores, na época Bethânia tinha trocado de gravadora e "foi acertado com a BMG que eu não faria o lançamento", comentou a cantora em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo (27/5/1999).




Na entrevista Bethânia comenta também sobre o  não gostar de divulgar seu trabalho na TV "Acho que as gravadoras todas trabalham, no ideal, para que entre uma música na novela, para que você faça o Faustão e pronto, está bom. Só entrei na novela. Marquei dez vezes o Faustão e não fui, estou até com vergonha. Não gosto de TV. Fui à Hebe Camargo, antes de entrar, no camarim, eu chorava: 'Pelo bem que você me quer, me deixa ir embora'. Eu soluçava. Não sou craque em TV, fico perdida, assustada", conta a cantor.

Questionada sobre a motivação de tanta repulsa, se seria por causa do "circo de horror que tomou a TV" ela responde usando o Programa do Ratinho - sucesso estrondoso entre 1998 e 1999 - como referência. "Esses depoimentos são da mesma pessoa que faz sucesso com "É o Amor", sucesso popularesco de dupla sertaneja", questiona a revista e a cantora é categórica: "Não entendo por que você pergunta uma coisa junto da outra. Não acho que faça parte do mesmo universo. Discordo."

O jornal ainda fala que a música era tema de um comercial do Sazon (condimento de tempero doméstico), popular no final da década de 1990. "Não tenho nada a ver com a propaganda do Sazon. Essa música, para mim, é bonita. O mínimo que me resta na vida é um pouco de liberdade (ri)". Na época saiu na imprensa que o Mariozinho Vaz tinha pedido para que ela gravasse a música para entrar na trilha sonora de "Suave veneno", novela de Aguinaldo Silva, e Bethânia desmente: "Não tem nada a ver, fui eu quem quis. Era um momento em que ia fazer um disco olhando para o interior, para a região onde nasci, o Nordeste. "É o Amor" é uma canção que sinto que toca toda essa gente do interior. Faz parte do meu pensamento, não está fora de nada", conta.

A cantora ainda comenta sobre a reação dos fãs, que comentavam, segundo o jornal de que "ela não precisava fazer isso": "Ficaram chocados. Mas não é questão de precisar, é querer. O entendimento está errado. Às pessoas que se vêem refletidas na minha arte, é bobagem pensar que tenham algum controle ou conhecimento completo de mim", Bethânia fala ainda ter mudado um pouco a melodia: "Até mudei um pouquinho da melodia, eles fazem naquele estilo deles de cantar, duas ou três notas, que não acho bonito, tirei".


Ouça o CD completo


Crítica: Bia Abramo
Qual é exatamente o grande escândalo em interpretar "É o Amor", de Zezé di Camargo? Tudo o que tem se falado sobre Maria Bethânia, seu disco e show recentes, "A Força que Nunca Seca", passa por esse nó. Antes de ir ao show, é preciso se deter um pouco aí. Maria Bethânia está pagando um preço razoavelmente alto por ser, a sua maneira, coerente. Ela sempre desafiou o "bom-gostismo", a doença classista da MPB que separa o "popular brega" do "popular chique".
(...) E agora isso, o aceno para o sertanejo, uma música popular que não ousa aspirar ao título de MPB, mas nem por isso deixa de ser uma música popular e brasileira, identificada (justamente) com o Brasil pós-Collor, demonizada (injustamente) por ser o brega do brega, o fim do mundo.
(...) E não será ela, Bethânia, artista que realmente almeja o título de popular, no sentido de ter um público amplo e abrangente, a voltar as costas para esse fato. Portanto, será ela, Bethânia, a primeira a tratar disso com respeito (Caetano recorrendo novamente a Peninha é outra história).
Não que "É o Amor" por isso deixe de ser a canção simplória que de fato é, nem que a escolha de Bethânia seja livre de algum tipo de cálculo (mas o é todo e qualquer movimento em música que tem de tocar no rádio, vender disco, atrair público?).
(...) Em seguida, refaz o percurso mítico/nostálgico da descoberta do "interior". Sai do mar enobrecido de Caymmi para vários sertões ("Trenzinho Caipira", "Luar do Sertão", "Azulão"), todos eles de alguma forma idealizados e bucólicos, primos arcaicos do sertão rico e triunfante de Zezé di Camargo. Por que será que o sertanejo humilde de "Romaria" é mais palatável do que os que afirmam "É o Amor"? Será que não é justamente porque o primeiro "sabe o seu lugar", lá quietinho no fim do mundo, e os segundos tomaram aquele que imaginávamos pertencer por direito ao nosso "bom gosto"?
(...) Ao lado de Antonio Marcos ("Como Vai Você"), Maysa ("Resposta"), Sueli Costa ("Encouraçado"), Roberto e Erasmo Carlos ("Costumes", "As Flores do Jardim da Nossa Casa") e, ousadia das ousadias, Chico Buarque ("Olhos nos Olhos"), "É o Amor" torna-se o que é, apenas mais uma canção de amor, como tantas outras, com toda a tontice e a emoção, a beleza e o ridículo próprios do falar de amor.
Ao mesmo tempo reinseridos no sertão da música popular e na tradição dos arroubos românticos, "É o Amor" e Zezé di Camargo surgem destacados do mundo cão em "A Força que Nunca Seca" pelo canto preciso, embora comovidíssimo, de Bethânia. Talvez o mundo esteja mesmo no fim, mas, que raios, também há o amor e Bethânia para cantá-lo. 

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